sexta-feira, 21 de junho de 2013

ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O MAR - Publicado no Jornal do Pico a 21 de junho de 2013


Estratégia Nacional para o Mar

Na sequência de uma intervenção efetuada, por mim, num programa televisivo e radiofónico, relativo ao tema “ ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O MAR”, julgo ser pertinente esclarecer o seguinte:

É indiscutível que o mar continuará a ter os seus usos tradicionais – via de transporte, pesca e meio de laser – passando contudo a ter novas utilizações – aquacultura, exploração dos fundos, etc.

No que diz respeito aos usos tradicionais, somos uma Região rica em espécies demersais e pelágicas e onde o turismo marinho tem já desenvolvimento significativo.

Realce-se que no turismo marinho, em 2008, as receitas diretas foram superiores a 2 milhões de euros e que estamos incluídos nos 10 “hot spots” a nível mundial.

A pesca tem a importância e o peso que todos lhe reconhecemos. A aquacultura tem também excelentes possibilidades sobretudo no que diz respeito a espécies como a lapa, a craca e o ouriço. Estou em crer que no que se refere a espécies piscícolas a questão deverá ser muito bem ponderada não só pelos danos ambientais que provoca mas também porque, segundo dados da FAO/OCDE, a mesma terá um incremento brutal nos próximos anos, mas é o peixe selvagem que será exponencialmente valorizado.

Tudo indica que preservar “stocks” e pescar, peixe selvagem, de forma sustentada será no futuro melhor negócio do que a criação de peixe em cativeiro.

No que diz respeito aos novos usos, somos uma Região onde se situam grande variedade de montes submarinos, vulcões ativos, sistemas quimio-sintéticos e formas de vida extrema. Possuímos ainda fundos ricos em nódulos polimetálicos, sulfuretos maciços polimetálicos e crostas de ferromanganês ricas em cobalto.
Há contudo enormes obstáculos a vencer porque se, por um lado, nos usos tradicionais as competência estão claramente definidas, por outro lado, no que diz respeito aos novos usos não só não estão definidas como a sua definição será, provavelmente, a batalha mais difícil, mas também a mais importante que os Açores terão de enfrentar nesta que é a segunda década deste século.
 
Questionado sobre a possibilidade de nos Açores, aproveitando a sua localização geoestratégica, ser criado um “HUB” Atlântico, esclareci ter
sérias reservas relativamente a essa possibilidade porque:

1 - Como consequência das alterações nos Canais do Suez e do Panamá cada vez teremos navios maiores a atravessar o Atlântico Norte;
2 - As economias de escala geradas por esses navios - capacidade acima dos 18.000 mil TEU´s - terão como consequência fretes mais baratos, mas também menor número de escalas;

3 - Tais navios não poderão escalar nenhum dos portos da Região, não só pelo seu comprimento e pela falta de meios de descarga, mas sobretudo devido ao seu calado - cerca de 20 metros;

4 - Como é sabido esses navios, nas travessias atlânticas, navegam segundo rotas ortodrómicas - porção do círculo máximo que une o ponto de partida ao ponto de chegada a qual corresponde à distância mais curta entre esses dois pontos; 

5 - Como consequência do ponto anterior e traçando essas rotas numa carta gnomónica, verificamos que os Açores ficam muito afastados de todas as rotas efetuadas. Um navio, com essas cateterísticas, custa dezenas de milhares de euros por dia. Qualquer desvio implica perdas em tempo e em dinheiro que, no limite, podem ascender a centenas de milhares de euros;

6 - Ao analisarmos essas rotas, no mapa anexo, pode-se confirmar isso mesmo. A pequena rota que se aproxima dos Açores, cujo registo se vê no mapa, acontece porque, em situações de mau tempo extremo, os navios desviam para sul, fazendo rumo a um ponto próximo dos Açores e à latitude de Santa Maria, continuando a partir daí a viagem. Tal não se deve à existência do Arquipélago, mas apenas a uma fuga a condições extremas de mar e vento;

7 - Se verificares todos os portos da orla marítima atlântica que prestam serviço “hub”, concluímos que servem um vasto hinterland com dezenas ou centenas de milhões de habitantes. Essa não é condição única, mas é condição indispensável para a existência de um centro “hub”;

8 - Um negócio dessa natureza não pode avançar sem a existência de um porto com condições para receber tais navios, o que implicaria um investimento superior a mil milhões de euros e ainda a um ou mais operadores internacionais dispostos a lá operar e a investir;

9 - Não chega a Região investir, confiante de que tem um operador internacional para lá operar. É fundamental que o grosso do investimento seja desse ou desses operadores dado que essa é a única garantia da continuidade temporal da operação e de que, passados uns meses, o investimento não é dado como perdido. Veja-se o que aconteceu no Porto de Sines com a MSC – Mediterranean Shipping Company. Neste caso só a figura da concessão se poderá justificar.

Julgo que esta questão deve ser analisada sem paixões e com uma visão profissional competente e estratégica do negócio, o que até agora não aconteceu. Depois de cometido o erro, não há retorno possível e a Região não tem capacidade, financeira e de negócio, para poder brincar com coisas desta dimensão.

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